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Criadores da .pormenor, Bernardo Cordeiro e Matheus Almeida. 

Nas Costuras Do Subúrbio

A Marca suburbana de Bento Ribeiro conta histórias apagadas da sociedade através das peças.

Por Olívia Itagiba

No efervescente cenário da moda carioca, onde tendências nascem e desaparecem tão rápido quanto um desfile de escola de samba, uma marca se destaca pela sua abordagem singular. A .pormenor  criada pelos  sócios Matheus Almeida (29) e Bernardo Cordeiro (29), em 2016, emerge de Bento Ribeiro como um farol de autenticidade. Com narrativas profundas, resgata a alma dos bairros periféricos em cada peça de roupa

 

Os dois amigos criam não apenas uma marca de roupa, mas um manifesto cultural, uma forma de dar voz às experiências e identidades muitas vezes marginalizadas  e esquecidas pela moda tradicional. Em um cenário onde a cultura é considerada superficial e efêmera, a .pormenor se destaca pela sua capacidade de representar jovens que a sociedade finge não existir.

"Queríamos criar algo que fosse verdadeiramente nosso, que contasse as histórias do nosso povo", explica Bernardo.

A criação da memória

 

A marca encontra suas raízes em uma mudança cultural ampla que ganhou força no Rio de Janeiro, nos últimos tempos, um movimento que busca resgatar a identidade e a memória dos bairros periféricos da cidade. Fazem parte de suas coleções homenagens a ídolos locais do futebol, como Ado do Bangu, e releituras criativas de símbolos e personagens marcantes da cultura suburbana.

A moda do futebol suburbano

Uma das coleções mais emblemáticas da .pormenor foi inspirada nos times de futebol do subúrbio carioca, como o Olaria, o Bangu e o Madureira. Bernardo e Matheus mergulharam fundo nas histórias dos times. O resultado foi uma coleção que não apenas homenageia o passado, mas também lança um olhar crítico sobre o presente e o futuro do futebol suburbano.

A violência estampada pela cidade

Em 2019, a dupla lançou o que viria a se tornar uma das suas coleções mais comentadas, “Cidade de Desespero”, em parceria com  o artista Rival, traz estampas e mensagens que remetem à treze casos famosos de violência no Rio de janeiro. Entre eles o assassinato da vereadora Marielle Franco, o caso do menino João Hélio,  e o Ônibus 174. A frase-chave da coleção, "Vocês pensaram que a gente esqueceu?", mostrou para o público as feridas desses eventos que ainda não foram curadas.

Porém, para os sócios Matheus e Bernardo, a criação da coleção foi um processo intenso e emocionalmente desgastante. Os meninos enfrentaram crises de ansiedade e ataques de pânico durante o processo criativo. Além disso, a equipe passou por outros desafios, como o roubo de dinheiro do colaborador responsável pela criação da coleção e a perda do filho da costureira que produzia as peças, o que levou a uma pausa no processo criativo.

“Era tanta informação ruim que a gente tinha de violência, de covardia durante a criação. Foi pesado para caramba[...] Depois dessa eu falei: "nunca mais eu faço". Mas depois eu entendi também que é sobre processos artísticos, faz parte. Por isso que hoje em dia eu prezo tanto por essa leveza de criar, tá ligado?”- comentou Bernardo

Apesar dos desafios, a coleção “Cidade Desespero” representou um marco na trajetória da .pormenor, que buscou contar histórias através dos tecidos e da moda.

Roupas que inspiram

A última coleção da .pormenor, intitulada "ME EMPRESTA Ø DRAGÃØ", marca o retorno da marca após um período de pausa criativa. Inspirada e lançada no dia de São Jorge, com um evento gratuito na Praça Tiradentes, a coleção propõe uma reflexão profunda que  se, ao invés de matar o dragão, abraçar essa figura mitológica.A ideia é explorar os próprios "dragões" internos como um caminho para o autoconhecimento e a aceitação.

As roupas questionam padrões estabelecidos, tanto editorialmente quanto nas formas de se vestir,com looks inspirados nos tradicionais churrascos e nas turmas de bate-bola do subúrbio carioca.

A busca por talentos fora das revistas

Ao contrário da moda convencional, que muitas vezes busca modelos estereotipados, a .pormenor encontra seus rostos para as campanhas nas ruas. São pessoas comuns, que dão vida às peças da marca. É uma forma de celebrar a diversidade e a autenticidade do subúrbio carioca, e por isso, é rejeitado os padrões impostos pela indústria

Bernardo revelou não apenas o processo criativo por trás da marca, mas também a sua visão crítica sobre o mercado e a cultura do local de origem. Para ele, a moda não deve ser apenas uma questão de tendências e lucro, mas sim uma forma de expressão e resistência.

"Queremos mostrar que a moda pode ser inclusiva, que pode dar voz às pessoas que não têm voz", afirma Bernardo.

 A marca suburbana reforça a ideologia de que a verdadeira beleza está na diversidade e na autenticidade. Suas peças vão além das tendências passageiras e criam raízes profundas em uma cultura rica e multifacetada. As roupas que contam as histórias com uma costura delicada e precisa entre o passado, o presente e o futuro do subúrbio carioca.

Laboratório de Jornalismo I

Prof. Chico Otávio 

Rio de Janeiro, RJ, Brasil

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