Fundação Parques e Jardins luta contra escassez de fundos e funcionários para permanecer de pé
Maior parte do plano de arborização do Rio nunca saiu do papel
Programa de recenseamento de árvores da cidade não foi realizado, apesar de ser o mais importante do planejamento
Por Carolina Rocha
Em um Rio de Janeiro conhecido pelo verde dos cartões postais, apenas 7% do planejamento de arborização da cidade efetivamente saiu do papel. O Plano Diretor de Arborização Urbana, promulgado em 2016, previa a efetivação de 199 tarefas. Segundo um levantamento da Fundação Parques e Jardins (FPJ), órgão responsável por essa arborização, apenas 14 se concretizaram.
O projeto mais importante que ainda não foi realizado é o Censo Arbóreo do Rio - um inventário de todas as árvores da cidade, que custaria cerca de R$6 milhões, segundo o próprio Plano Diretor. De acordo com Flávio Telles, membro da Sociedade Brasileira de Arborização Urbana, sem esse inventário é mais difícil realizar ações efetivas de arborização. “O censo de arborização da cidade é primordial para a gente saber realmente qual é a quantidade de árvores que têm na cidade, qual é o real déficit”, esclareceu Telles.
A maioria dos programas de plantio não são feitos com orçamento próprio dos órgãos públicos. Eles são efetuados através de instrumentos legais, como medidas compensatórias, e por empresas credenciadas pela própria FPJ. De acordo com Telles, o setor de construção civil é o principal motor do financiamento da arborização no Rio de Janeiro hoje em dia, mas a indenização pelas árvores cortadas nem sempre é equivalente ao que foi perdido.
"É difícil ter uma quantidade significativa de árvores, porque se a construção civil está em baixa, planta-se pouco. Se a construção civil está em alta, planta-se muito. Mas em compensação também se tira árvores. E uma coisa é você tirar uma árvore adulta, outra coisa é você plantar uma muda", o engenheiro florestal explicou.
Origem dos problemas
Os principais motivos dessa defasagem na arborização são a falta de funcionários e escassez de recursos para o plantio. O Plano Diretor já dizia que a FPJ estava em “estado de sobrevivência” e, segundo Cláudio Alexandre, engenheiro florestal da Fundação, a situação hoje em dia é ainda pior. Em 38 anos, a quantidade de técnicos no quadro permanente da Diretoria de Arborização diminuiu de mais de 20 para apenas 6. Isso porque os profissionais se aposentaram e não houve reposição no quadro de funcionários.
"O mais dramático é que grande parte das aposentadorias aconteceram num período de tempo muito curto. Saiu todo mundo do dia para noite, foi um arrebatamento", Alexandre explicou, "A perspectiva é muito ruim. A gente tem muito medo disso aqui parar. O comentário não tem nenhum tom de crítica, mas simplesmente não tem concurso. A Fundação tem que se virar com o que tem."
O dinheiro também é escasso. A Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Clima recebeu, esse ano, R$200 mil reais de verba para o replantio de árvores em áreas urbanas - ação gerida pela FPJ - enquanto a Diretoria de Arborização da Fundação não ganhou recurso específico para fazer essa arborização. "No início dos anos 2000, nós chegamos a plantar 50 mil árvores no ano, quase tudo com recurso próprio. Hoje é uma briga para conseguir plantar. No ano retrasado, plantamos quase 10.000. Só faltou soltar fogos", Alexandre disse.
Procuramos a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Clima durante a realização dessa reportagem, mas ainda não recebemos resposta.
Parceria com a população
Dentre os projetos do Plano Diretor, a Fundação conseguiu concretizar aqueles que não precisavam de dinheiro para serem colocados de pé. Um dos mais importantes é a interação com a sociedade civil através de coletivos - grupos de bairro organizados por moradores para plantar e conservar árvores na vizinhança.
O coletivo ambientalista Olaria Verde faz parte desse projeto. Fundado em 2019 no bairro de Olaria, o grupo surgiu a partir da insatisfação de moradores depois de uma tempestade que derrubou diversas árvores na região. Hoje em dia, ele tem quase 100 membros. Daniel Gustavo, um dos cofundadores, disse que o coletivo plantou cerca de 400 árvores ano passado e já fez um corredor verde na principal rua de Olaria.
"O coletivo tem três pilares de sustentação. O primeiro é plantar de fato. O segundo é educação ambiental, que a gente atua nas escolas, faz oficinas em praças públicas etc. A terceira é a parte da militância, que é justamente cobrar esse posicionamento, destinação de verbas e políticas públicas dos órgãos governamentais e dos políticos", Daniel relatou.
Apesar do coletivo já completar 5 anos de atuação, a parceria com a Fundação Parques e Jardins só começou no ano passado. Segundo Daniel, o vínculo surgiu depois de uma grande mobilização popular. "A gente vem pedindo muda, terra, insumos de vários tipos - como hidrogel, um produto que mantém a planta hidratada sem ter que ficar irrigando toda hora. Nem sempre eles atendem. A gente sabe que eles têm menos pessoal, mas tem que cobrar, se não eles também não fazem. É esse jogo", ele relatou.